6.2.14

transporte

havia um espírito na estrada. quem passasse por lá o veria pálido, translúcido, entediado. estava condenado à eternidade naquele trecho de asfalto. 20, 30 metros...
os bichos que viviam por lá o conheciam bem. conversavam com ele no curto espaço em que podia transitar, depois, até amanhã.
o fantasma já havia se irritado, aceitado, passado e repassado por todos os estágios de qualquer sistema que mede sentimentos, mas o que o incomodava mesmo era não saber quanto tempo mais tinha.
além disso, não se lembrava do que fizera em vida, não tinha nome, não tinha história. não sabia o que havia feito para merecer o castigo.
procurava sentido em tudo, tentando decifrar as razões que o levaram até aquele ponto.
morreu na estrada? viveu na estrada? tinha que cumprir algum carma? estava esperando alguém?

a única via, o tédio, eterno meio.